Normalmente eu morria de medo, mas negava sistematicamente. Imagine só
se eu assumisse, seria a derrocada, o terror tomaria conta do meus pensamentos e
não mais eu acordaria para ir à escola. Porém, o tempo passou, já há um
distanciamento histórico o suficiente para eu rir do passado e contar este
fato.
Foram anos a fio com a mesma rotina: acordar, levantar, lavar o rosto,
esquentar a água no fogão – era muito frio pela manhã e não tínhamos chuveiro
elétrico – e vestir o uniforme escolar.
Ah, ia me esquecendo do leite quente com biju, já era costume. Após
essas atividades básicas eu estava preparado para enfrentar a estrada de chão,
poeira quando não chovia, e barro quando São Pedro resolvia abrir as comportas
do céu. Contudo, meu maior inimigo era a escuridão. Eram três quilômetros de
puro breu, a última luz que viu, até dobrar a esquina dos eucaliptos e do
açude, era a que ficava na beira do casebre onde eu e minha família vivíamos. A
partir dali escuridão total! De vez em quando, uma companhia corria por entre
os capões, o coração acelerava, os passos alargavam e em instantes aquele
espectro ficava para trás.
Em dias de luar era um paradoxo. Ora eu me sentia satisfeito pelo clarão
que provinha da lua e deixava a estrada menos escura; ora o medo aumentava,
pois os vultos e sombras aumentavam... e é preciso levar em consideração que a
imaginação de uma criança é fértil: a sombra refletida de um arbusto se tornava
em um mostro assustador, as estórias que vovó contava à luz da vela nas noites
em que faltava eletricidade se concretizavam ao longo da estradinha.
Na subida que antecedia a chegada ao ponto de ônibus – este ponto ficava
na estrada menos apertada batizada de estrada grande – eu já via o breu do céu
dando lugar ao gris da aurora, mais um pouco de tempo e se podia perceber os
primeiros raios do Sol apontando no horizonte. Um alívio no peito somado a uma
sensação de vitória. Agora bastava aguardar o ônibus escolar rural para vencer
mais dez quilômetros na companhia de outras crianças. Enfim o sino soou e as
atividades escolares começaram.
Rodrigo Stankevicz
Nenhum comentário:
Postar um comentário